quarta-feira, 15 de junho de 2011

Entrevista com a bióloga Maria Clara Figueiredo.

Quais são os marcos da pesquisa sobre os nossos genes?
Há vário marcos na evolução da genética. Mas os procedimentos, como a análise e o mapeamento do genoma humano, só puderam ser desenvolvidos com a incorporação de outras metodologias. Foram os estudos da sequência de pares de base de DNA — com ferramentas físicas e químicas, que permitiram estudá-lo em pedaços — que tornaram possível a análise do genoma humano. Outra técnica importante é a do PCR, a reação em cadeia da polimerase que faz milhões de cópias a partir de fragmentos pequenos de DNA, ampliados em laboratório.
O que representou a identificação do genoma humano para a medicina?
Uma enorme contribuição. O esforço internacional, que reuniu uma força tarefa bastante grande, conseguiu fazer a leitura da seqüência de pares de base em todas as nossas moléculas de DNA. Todos nós, numa célula normal, temos 46 moléculas de DNA compactadas (22 pares de cromossomos autossômicos e um par de cromossomos sexuais). O genoma haplóide, que são as 23 moléculas, foi totalmente decifrado. isso significa, por exemplo, que, em tumores, já é possível identificar mutações nos genes BRCA1 ou 2, ligados ao câncer de mama. Em outras doenças importantes, como a fibrose cística ou a doença de Tay-Sachs, são identificadas mutações dos genes associados, que permitem tratar e estabelecer medidas de prevenção à doença.

O estudo do genoma ajudou a entender como age cada uma das seqüências de genes?
Sim, se não houvesse esse domínio sobre a seqüência inteira do genoma, todo o conhecimento posterior a ele seria limitado. Agora temos o desafio de entender o quê a seqüência significa. Quanto do nosso genoma tem função específica, ou seja, ele participa de todo o processo do metabolismo celular, da formação de proteínas, etc? Quais genes atuam em conjunto? Qual deles precisa da participação de outro gene para poder se expressar, para fazer seu efeito? Onde, no nosso organismo, os genes funcionam? Sabemos que eles não se movimentam ao mesmo tempo. Existe um período na vida embrionária em que alguns genes são muito importantes, outros, com o envelhecimento, vão perdendo sua função. Esse mistério todo ainda requer bastante estudo da comunidade científica.
 Você defende a necessidade de os pesquisadores estudarem o genoma de forma contextualizada. O que isso significa?

A maioria dos biólogos moleculares estuda o DNA fora do contexto da célula e, mais especificamente, do núcleo. Contextualizar o DNA equivale a inserir o DNA no programa "citoplasma-núcleo", no qual o DNA é parte do programa e atua como dado do programa da "inteligência celular". O DNA sozinho não faz absolutamente nada. Preconizo que a Biologia Molecular dê mais relevância às estruturas intranucleares e à matriz nuclear onde o DNA está inserido. Para isso é fundamental um maior intercâmbio entre os morfologistas, biólogos moleculares e biólogos celulares.

Qual a importância da integração da Patologia com a Biologia Celular e Molecular?

Para responder a esta questão, costumo comparar a seqüência descontextualizada do DNA à elaboração de um mapa, que não corresponde à realidade do território. Quem caminha e explora o território da célula ou de um órgão ou organismo é o morfologista e o patologista. Daí a importância do que chamo de histogenômica (localização tecidual dos genes) e histoproteômica (localização tecidual das proteínas). A histogenômica e a histoproteômica irão definir uma futura anatomia do organismo. O futuro da genômica e da proteômica será inserir o DNA e as proteínas no contexto espaço-temporal do organismo.



e-mail: mclara.bio@hotmail.com